
Já parou pra pensar qual é a emoção despertada em nós após presenciar uma grande injustiça?
Já agiu tão impulsivamente, diante de algo que te enfureceu muito?
Alcance
Provavelmente, nesses momentos, a emoção predominante é a raiva. Popularmente muito conhecida, a qual faz parte quase que diariamente do nosso vocabulário de expressões, tais como “nossa fui tomado de raiva”, “gente que raiva que me deu”, mas, arriscamos dizer que seja a emoção menos compreendida entre nós. Isso porque, a raiva, é a emoção com maior impacto negativo nas relações interpessoais, justamente, porque pode despertar violências e agressividades. Dessa maneira, é uma emoção que tende a ser fortemente temida e desestimulada. O problema disso tudo, é que desestimular socialmente uma emoção, não vai fazer com que deixemos de senti-la, pois é uma reação, em certa medida, natural do nosso sistema nervoso e, além disso, camuflá-la, não nos ensina a lidar com ela. E aí sim, podemos agir no impulso, enfurecidos de raiva, tomar atitudes agressivas e até mesmo provocar violências.
Vamos entender isso melhor?
Turbulência
A raiva surge em situações em que nos deparamos com um obstáculo avaliado como hostil, que interfere no que se está fazendo ou intencionando a fazer.
Essa emoção tende a mover de maneira a remover o impedimento e mudar a situação atual, frequentemente de modo que destrua ou prejudique o alvo, neste caso, o obstáculo (MIGUEL, p.158, 2015).
“A raiva surge diante de algum obstáculo que nos frustra ou impede as nossas ações (...) Dessa forma, a raiva é a emoção que indica que algo está em nosso caminho nos prejudicando de algum modo e que, portanto, estaremos motivados para mudar o ambiente e retirar esse impedimento” (GONDIN, 2020, p. 79).
Ainda, segundo Barros (2020, p.78) as situações que envolvem comportamentos de outras pessoas, são as situações que mais desencadeiam nossa raiva, pois nas situações consideradas como fatalidade ou como inevitáveis, tendemos a nos aborrecer menos.
A RAIVA É UMA EMOÇÃO IMPULSIONADORA, CAPAZ DE NOS MOTIVAR PARA ENCARAR OS DESAFIOS DA VIDA
Essa é uma excelente função.
O problema reside na forma como nos impulsiona e os comportamentos assumidos partindo dessa motivação, ou seja, posso reagir impulsivamente e agir “de cabeça quente” porque estou com raiva, ou essa raiva pode ser uma inquietude, que me faz pensar sobre meu problema e somente após isso, partir para alguma ação.
A raiva, mesmo sendo despertada por diferentes motivos, seja quando nos sentimos ameaçados de perder algo, como status, autoridade, dominância, alguma coisa física e/ou simbólica, em situações em que percebemos que podemos ser prejudicados, ou seja, ela surge como um impulso de defesa sobre o que é nosso, ou sobre o que acreditamos ser nosso (BARROS, p. 77).
São infinitas as situações que podem desencadear raiva, tendo em vista ser um aspecto muito pessoal, que diz respeito a individualidade e a singularidade de cada sujeito, tem uma tendência a fazer com que as pessoas processem as informações advindas do ambiente de forma mais rápida.
Contudo, esse processamento não leva em conta todo o contexto, a raiva faz com que o sujeito crie um foco de atenção, mais relevante para ele naquele momento, ignorando outros fatores que poderiam ser relevantes para tomada de decisão (GONDIN, 2020).
APESAR DE SEREM DECISÕES RÁPIDAS, NEM SEMPRE SÃO EFICAZES E TENDEM A REPETIR PADRÕES OS QUAIS O SUJEITO JÁ ESTÁ ACOSTUMADO, POR ISSO, MUITAS VEZES AS PESSOAS, SE TORNAM AGRESSIVAS, DIANTE DE SITUAÇÕES QUE LHE DESPERTAM RAIVA. APRENDERAM A REAGIR DE ACORDO COM A RAIVA QUE SENTEM. SEGUNDO GOLEMAN (2011, P.94) “A RAIVA SE ALIMENTA DE RAIVA; O CÉREBRO EMOCIONAL ESQUENTA. A ESSA ALTURA, A RAIVA, NÃO TOLHIDA PELA RAZÃO, FACILMENTE EXPLODE EM VIOLÊNCIA”.
Quando entendemos a raiva e aprendemos que agir momentaneamente sobre o efeito imediato dessa emoção, não nos dá todas as condições de analisar melhor a situação que a desencadeou, podemos entender que é possível sentir raiva, sem necessariamente somente expressá-la de modo agressivo. Percebemos que as vezes é necessário se afastar do que gerou a raiva, para poder refletir melhor sobre como agir da melhor forma possível. Podemos ainda entender, que a principal função da raiva não é nos deixar passivos diante dos acontecimentos da vida.
Mesmo com um grande potencial de desencadear violências e agressividades, quando bem entendida e manejada, a raiva também é capaz de movimentar para mudanças necessárias que temos ao longo de nossa trajetória. Percebe-se a importância de uma avaliação sobre o que nos gera raiva, e mesmo um questionamento sobre quais as melhores formas para lidar com ela, bem como, uma avaliação sobre a dosagem de raiva com a qual temos convivido em nosso dia-a-dia, pois quando ela deixa de ser ocasional, e passa a nos dominar na maior parte do tempo e das relações, ela sinaliza que talvez estejamos necessitando de ajuda para compreender o que está ocorrendo, ela pode indicar a necessidade de acompanhamento profissional, a necessidade de algumas mudanças em nossa vida. Como posto por Vigotsky (2004), a emoção é um processo passível de desenvolvimento e transformação, a partir da consciência, da relação entre estados emocionais e estados intelectuais (MACHADO, FACCI e BARROCO, 2011, p.653).
Ou seja, além dos aspectos biológicos, a forma como reagimos às emoções, irá depender também da percepção psicológica diante dela, e tal percepção está em constante transformação e desenvolvimento.
